Dados da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) apontam que 5,8 milhões de pessoas morrem por trauma, a cada ano, em todo o mundo. No Brasil, as causas externas – que podem ser compreendidas, de modo geral, como os acidentes e a violência – representam a terceira causa de mortes e 12,5% do total de mortes por todas as causas, segundo levantamento do Ministério da Saúde. Na Bahia, o cenário segue a estatística nacional: as causas externas ocuparam o terceiro lugar em número de mortes, em 2018.
Para discutir esse problema de saúde pública, que causa forte impacto na morbidade e mortalidade da população, o Hospital do Subúrbio (HS) reuniu especialistas da área no I Simpósio de Trauma do HS, realizado no dia 13 de dezembro, no auditório do Salvador Business & Flat. Organizado pelo setor de Ensino e Pesquisa do HS e pelo Núcleo Hospitalar de Epidemiologia, o evento contou com três mesas-redondas que trataram da epidemiologia do trauma na Bahia, sistematização do atendimento ao traumatizado e situações especiais envolvendo vítimas de trauma.
O contexto da violência no estado da Bahia foi apresentado pela assistente social Jamile Lima, da Diretoria de Vigilância Epidemiológica (DIVEP), que falou sobre o conceito de violência e a notificação compulsória de violências por todos os serviços de saúde. Jamile também mostrou números relativos às notificações no estado, no período de 2009 a início de 2019, sendo mais de 30 mil notificações de violência apenas em Salvador, 61% de vítimas mulheres, e prevalência da violência física com mais de 75 mil notificações.
Trazendo dados sobre acidentes de trânsito no Brasil e na Bahia, Jucilene Assunção, sanitarista da DIVEP, apontou redução em 2018 na taxa de mortalidade por acidente de transporte terrestre no estado, em comparação aos anos de 2010 a 2017, passando de 18,7% em 2010 a 13,9% em 2018. De acordo com o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), 74,6% dos óbitos ocorreram na faixa etária de 20 a 59 anos. Embora os números mostrem uma redução nos óbitos, Jucilene destacou a preocupação diante dos altos custos de internamento decorrente de acidentes envolvendo, em sua maioria, motociclistas, e o esforço contínuo do Governo nas ações de fiscalização, educação e infraestrutura.
Encerrando as discussões da primeira mesa-redonda, o coordenador da Emergência do HS, Gabriel Cunha, apresentou o perfil epidemiológico do paciente traumatizado que chega ao HS, marcado por uma população de homens jovens, grande parte vítimas de acidentes de trânsito, com maior incidência daqueles envolvendo motos, e apresentando traumas contusos.
A segunda rodada de debates contou com explicações do coordenador do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), Ivan Paiva, que falou sobre a dinâmica do atendimento pré-hospitalar e esclareceu as funções do SAMU, a exemplo da organização do acolhimento ao paciente no serviço de saúde definido para recebê-lo, planos de ação para grandes eventos (carnaval, Copa do Mundo de futebol), atendimento a grandes catástrofes, cursos de primeiros socorros para leigos, entre outros. “Para nós, tempo é vida”, disse Ivan ao falar do compromisso do SAMU em garantir o atendimento médico no local da ocorrência e atuar como retaguarda dos serviços de saúde.
Em seguida, foi a vez do coordenador da Neurocirurgia do HS, Adroaldo Rossetti, abordar o atendimento inicial ao paciente vítima de neurotrauma. “O atendimento ao neurotrauma começa no local onde ocorreu o trauma”, destacou o neurocirugião, que exibiu dados sobre o aumento do traumatismo cranioencefálico em algumas regiões do mundo, como Ásia e Oriente Médio, ressaltando a falta de estatísticas suficientes no hemisfério sul. O traumatismo craniano é causa de metade da mortalidade nos pacientes politraumatizados.
Finalizando a mesa-redonda, o coordenador da Linha Cirúrgica do HS, Divaldo Ribeiro, apresentou o Protocolo de Trauma do hospital, indicando o percurso do paciente dentro da unidade e as etapas do atendimento, com acionamento dos mecanismos da Onda Vermelha – abordagem para pacientes com sinais de hemorragia grave -, da Rota 1 (demais casos de trauma grave) e da Rota 2 (casos menos graves e traumas leves), implantados pelo HS. “A sistematização contribui para maior agilidade na identificação do trauma grave, melhor comunicação entre setores e organização da equipe assistencial”, pontuou o cirurgião.
Para encerrar o evento, a última mesa de discussões contou com apresentação da coordenadora da Agência Transfusional do HS, Isa Lyra, que deu uma aula sobre a coagulopatia (distúrbio em que o sangue não coagula normalmente) induzida pelo trauma e o consumo de hemoderivados nos pacientes politraumatizados, que, devido às lesões, podem sofrer sangramentos maciços. O Protocolo da Onda Vermelha, voltado à abordagem ao paciente com choque hemorrágico, foi o tema desenvolvido pela cirurgiã geral do HS, Ana Célia Romeo, que ressaltou a importância das “golden hours”, as primeiras horas em que a rapidez do atendimento é fundamental para salvar a vida do paciente.